Era uma vez uma jovem wrestler que sonhava ser campeã feminina da WWE, mas que desde cedo parecia ter o seu destino facilitado devido às suas origens familiares. Claro que elas não são o único motivo pelo qual está no lugar onde está, o grande problema está no facto da própria companhia apresentar esse aspecto como principal razão para o sucesso de Charlotte Flair.
Aliás, toda a construção da personagem dela ao longo dos últimos anos esteve em torno do facto de ser a Diva “geneticamente superior” porque é uma Flair. Ou seja, a Charlotte tem todo o talento do mundo mas da forma como é apresentada não se torna fácil de gostar dela, a menos que faça a taunt do pai.
E mesmo assim não será com um monte de “Woo´s” que conseguirá tornar-se na tal referência da divisão feminina que a companhia parece querer que se torne. Não quero com isto dizer que ela até nem pode não vir a ser uma face bem sucedida, e nem precisa para isso que esconda o nome da sua família. Basta é que assuma uma postura autónoma e deixe de ter o Ric Flair ao seu lado nos momentos mais importantes da sua carreira (em TV claro).
No entanto quando se quer criar uma carreira em nome próprio é importante que se tenha a sua própria identidade, e se evite usar os traços característicos de alguém com sucesso na indústria que pertença à sua família. Nós nunca vimos o Randy Orton a precisar de fazer as taunts do pai, ou mesmo usar as suas catchphrases para ter sucesso. Claro que não negaram as suas origens, mas também foram os argumentos para o seu sucesso.
Basicamente, é possível essa conjugação Família e sucesso. Contudo não se deve ter esse elemento familiar presente constantemente. E no caso da Charlotte esse manto paternal tem sido uma presença constante desde do NXT, e ao contrário do que a WWE poderá pensar esse manto é possivelmente o motivo pelo qual acaba por não conquistar os fãs na sua plenitude.
Ric Flair não pode ser uma presença tão constante nas promos, e no auxílio à filha em grandes combates porque esse factor acaba por prejudicar mais a Charlotte do que propriamente ajudar. Isto claro se a WWE quiser que ela seja uma face bem sucedida, caso o contrário, a “menina do papá” resultaria na perfeição numa personagem heel dela. Sendo quiçá esse o cenário ideal para esta primeira fase da sua carreira na WWE, ao contrário do que parecem ser o planos da companhia, pelo menos à partida.
Pelo menos esses planos permitiam que o facto de ser apresentada como filha do Flair fosse algo positivo, mesmo que essas consequências positivas fossem sobretudo para si própria. Por outras palavras este cenário possibilitaria que a actual campeã de Divas criasse uma identidade própria, ou pelo menos teria uma identidade que a beneficiaria.
Claro que o ideal seria que conseguisse criar uma personagem que fosse independente da sua família, mas a verdade é que já é tarde de mais para mudar a situação e dificilmente alguma vez os fãs a verão como alguém independente do pai. No futuro ela até pode provar a todos que merece a sua oportunidade pelo seu talento, mas mesmo assim dificilmente não terá momentos onde será tratada como “Baby Flair”, e isso acontecerá porque a própria companhia o fez desde do inicio.
Mesmo no NXT, quando era parte das BFF´s e ela e a Sasha estavam na sombra da Summer Rae já era apresentada como a talentosa filha de Ric Flair. Ou seja, desde cedo que a WWE nos apresenta a Charlotte com alguém que é talentoso não por mero acaso, mas porque é um Flair. E se ela é talentosa, porque é, não deviam forçar tanto a ideia que esse talento é algo genético.
E quando se fica refém de um estigma tão cedo quanto aconteceu com a Charlotte torna-se difícil de mudar essa perspectiva, porque no wrestling por vezes a primeira impressão é letal. E no caso da Charlotte essa foi claramente que era valorizada por ser filha de quem é, e por mais que ela tente afastar essa sombra no seu discurso, ela é grande de mais para que possa fazer esse trabalho.
A juntar a isso tudo, temos também o lado excessivamente emocional com a qual é apresentada pela companhia em quase todos os segmentos. Vê-la a chorar constantemente acaba por não ser agradável, porque não o é feito de forma equilibrada, e acaba por perder o impacto que um momento desses pode ter na situação certa.
O que quero dizer é que são tantas as vezes em que quebra a personagem e mostra o lado pessoal que em vez disso jogar a favor dela acaba por ser apenas mais um inimigo. Eu até considero que um wrestler pode mostrar esse lado pessoal, ou mesmo quebrar a personagem, apenas não o poderá banalizar, caso o contrário acabam por perder um pouco a credibilidade enquanto performers.
E sem dúvida que o lado emocional da Charlotte é um dos seus principais handicaps, sobretudo se juntarmos o facto das outras lacunas serem no campo do acting e storytelling, este factor torna-se mais preocupante. Porque não existe nada pior do que alguém que representa um papel e que tente ser emocional, mas cujas expressões faciais não correspondem a essas emoções. E isso foi comprovado a quando da promo pessoal que teve no main-event da Raw antes do Survivor Series.
E quando correspondem ela transborda essas emoções para níveis exagerados que a levam a perder o controlo da personagem. E por isso mesmo é que defendo que o cenário ideal para ela seria um heel turn porque já que querem construí-la como uma Flair, então que desenvolvam a personagem através de um lado mais “negro”.
Mesmo que esse turn dê razão aos argumentos da Paige, a verdade é que ele resolveria o problema de booking que a WWE tem neste momento com ela. Porque é notório que mesmo com a presença do seu pai que ela não conquista os fãs, e eles acabam por reagir apenas quando faz a taunt dele.
No entanto duvido que a estratégia da companhia passe por esse turn mesmo depois do momento da Raw onde jogou sujo para vencer a sua amiga Becky Lynch. Acredito que esse segmento serviu sobretudo para dá um tom ligeiramente diferente à sua personalidade, e demonstrar que tal como o pai fará tudo para vencer mesmo contra as suas amigas.
Digo isto porque duvido que a WWE abandone tão cedo a ideia de a fazer a principal face da divisão feminina, até porque se fizesse o turn neste momento só ficaria com a Becky como face, e por mais que ela seja talentosa duvido que apostem nela como top face feminina nos próximos tempos. Esta história até poderá trazer uma apresentação mais forte à Becky, e quiçá colocá-la próxima de vencer o título, no entanto parece-me claro que a Charlotte irá sair por cima no final da mesma sem que necessariamente se torne uma vilã.
Em suma não imagino a WWE a alterar a personagem actual da Charlotte por mais que essa mudança fosse importante e benéfica para mesma. Mas a verdade é que o booking feminino do main-roster nem sempre se preocupa em potenciar e diferenciar as personagens. E por isso parece-me certo que a WWE aposte na “Baby Flair” tal como o tem feito até agora, e nos apresente até à exaustão milhões de “Woos”.
10 Comentários
Excelente artigo. Concordo, é mesmo uma pena que uma mulher com tanto talento seja constantemente associada ao seu pai. Como é que ela se pode destacar e criar uma identidade forte para ser relembrada se ela copia as taunts ou mesmo o finisher do pai e for assim a sombra do Ric Flair? Claro que o uso do finisher e algumas referências ao pai seriam benéficas caso ela fosse heel e quiçá se aliasse à Authority. Talvez o “angle” com a Becky Lynch na Raw passada tenha dado início a um heel-turn, ou então uma feud entre as duas futuramente pelo Divas Championship, com a Becky a ser mais face que a Charlotte, mas no fim do combate resolvessem as coisas e se cumprimentassem, seguindo cada uma o seu caminho, deixando a Becky brilhar a solo sem estar na sombra da campeã.
Já agora, José, gostei bastante de um conceito que fizeste há dois anos, o Wrestling.PT Awards, e adorava que voltasses a repeti-lo este ano. Acho que seria benéfico para o site e seria divertido para os leitores.
Primeiras impressões ultimas impressões, não sou muito fã da Charlotte quanto da Becky e Sasha Banks, mas seu talento em ringue é uma coisa que não podem retirar da mesma, gostaria muito que Becky fosse a Top babyface da companhia, ela tem o pacote completo para isso, espero que a WWE abra os olhos para ela! e que venha uma feud da Becky vs Paige rápido! XD
Acho que até não é culpa da Charlotte essas constantes aparições do Ric Flair, creio que a empresa tenta ao máximo trazer lendas pros shows semanais e neste caso nem precisam de muito, ele é pai dela e veio ver a filha e pronto. Sou contra também, mas dificilmente isso vai parar de acontecer. Da Charlotte eu gosto muito, principalmente como heel.
Não gosto nada da Charlotte mas admiro o seu trabalho.
A Charlotte é muito talentosa (só falta um pouco mais de carisma). Uma pena ela ser sempre associada ao pai.
Charlotte como face não funciona, ela como heel no NXT caiu como luva. Apesar de algumas referencias ao pai, naquela época aquilo não afetava muito a imagem dela como afeta hoje como a garotinha do papai chorona. A personagem dele como vila era boa e sua feud e combates com a Sasha, Becky e Bayley como heel eram ótimos, além de serem sempre ovacionadas. Bastou subir para o roster principal para acabarem de vez com a imagem dela.
Não concordo totalmente. Acho que a Charlotte sempre foi apresentada como uma competidora forte por si mesma, mesmo que tenha sido sempre apresentada como a geneticamente superior, mesmo com alguma proximidade com o Ric Flair, aliás a feud com a Paige andou muito à volta disso mesmo, a Paige a tratá-la por Baby Flair e a Charlotte a tentar provar o contrário. Os únicos pontos negativos são: o Ric Flair a aparecer constantemente nas celebrações da filha, aí concordo contigo, outro ponto negativo é o que aparenta ser a WWE a ir pelo caminho do “dirtiest player in the game”, mas como até gosto quando as heels têm razão… 😛
Quase ninguém fala da Becky Lynch. Está bastante “irrelevante” pelo jeito.
Eu espero que a Rebecca Knox venha para a TNA um dia, quem sabe.
O título do artigo é “The Woo Girl”. Já está começando a fazer críticas sem sentido apenas para chamar a atenção, está carente?
Eu estou falando em geral.
Excelente artigo, nada com que discordar.