Boas a todos nesta grande casa que é o Wrestling PT!

Bem-vindos ao primeiro Brain Buster de 2021, mas antes de ir ao tema que me levou a escrever este artigo, gostaria de referir que espero que todos tenham tido uma maravilhosa época de festas, um Natal que tenha permitido estar com o máximo de família possível nesta época tão especial em que se matam tantas saudades, assim como um ano novo espetacular. Que tenham tido a companhia dos vossos, o aconchego das casas quentinhas e os vossos estômagos completamente cheios. Neste último aspeto, eu cá vos digo que tratei bem do assunto!

Mas indo agora ao tema desta semana, gostaria de partilhar algumas notas e ideias sobre o trabalho que se desenvolveu com a NOAH em 2020, e a forma como o seu crescimento, bastante notável durante este ano diga-se, pode ter uma nota de continuidade também este ano. Há, no entanto, bastantes aspetos que me preocupam, relativamente, não à capacidade de a NOAH crescer, mas de o fazer de forma sustentável.

O que quero dizer com isto, é que acredito que se a NOAH seguir a mesma fórmula que seguiu este ano, porque teve resultados, terá, acredito eu, um crescimento a curto-prazo. Contudo, não antevejo que tal crescimento tenha a sustentabilidade suficiente para perdurar por muito tempo, o que faria a NOAH voltar à estaca 0.

Nos últimos cinco anos, a vida da NOAH foi, sem dúvida, bastante complicada, entre várias presidências, grupos empresariais, notícias degradantes da sua imagem ou entras situações, uma promotora que outrora conseguia ser a Nº1 do Japão, ou pelo menos muito perto disso, viu-se ultrapassada por várias e foi ficando cada vez mais para trás. Não só o booking não ajudou, mas talvez a principal razão para a NOAH ter chegado aonde chegou foi a sua inacreditável incapacidade para criar novas estrelas.

Vejamos, no seu curto espaço de vida, podemos falar em várias gerações de lutadores que dominaram esta promotora. Não contarei com nomes como Mitsuharu Misawa ou Kenta Kobashi que eram nomes e grandes estrelas já da AJPW dos anos 90 e que foram a origem da NOAH já nos anos 2000. Estou sim a contar com os nomes que a NOAH atribuiu ao estrelato, que foi realmente o seu booking que as construiu e que lhes atribuiu o estatuto que lhes reconhecemos: a geração marcada por KENTA e Naomichi Marufuji; pelo Takagi Sugiura e pelo Go Shiozaki; pelo Katsuhiko Nakajima; e, o lutador que compõe a última geração de estrelas que a NOAH alguma vez criou, o Kaito Kiyomiya.

Brain Buster #91 – Sustentabilidade

E mesmo dentro destes, se o KENTA e o Marufuji foram estrelas instantâneas em quem a NOAH podia confiar para serem as suas caras, o mesmo já não se pode dizer dos restantes. A ascensão do Sugiura ao main-event foi sempre muito mais marcada pelo seu excelente trabalho, do que propriamente com a intenção de fazer dele uma das caras que realmente vendesse os shows da fed. O Go Shiozaki foi, a seguir ao KENTA e o Marufuji, o lutador em que se depositou mais confianças, mas nunca conseguiu chegar ao nível destes em termos de popularidade. O Nakajima nunca se afirmou e é uma eterna promessa que ainda se espera afirmar. Atualmente, o Kaito Kiyomiya é o lutador que mais probabilidade tem de chegar a esse patamar tão pretendido. Ao patamar dos Tanahashis e dos Okadas, dos Kentas e dos Marufujis, etc.

Não será difícil de adivinhar que, com a morte do Misawa em 2009, a reforma do Kenta Kobashi em 2013, a saída do KENTA em 2014 rumo à WWE, o leque de estrelas ficou imensamente reduzido ao Marufuji e, a lutadores já de segundas linhas, como o Go Shiozaki e o Sugiura. Além disso, em 2015 e 2016, tivemos a história de invasão dos Suzuki-gun, que limparam o roster todo em termos de títulos e grandes vitórias, e que quase nunca colocaram over os lutadores da NOAH, ou pelo menos lutadores novos e caras refrescantes. Tudo voltou a ficar pela velha guarda, e foi uma oportunidade perdida de se tentarem fazer novas estrelas.

Olhando para essa história, o Suzuki venceu o Marufuji pelo belt e voltou a perder o belt para o mesmo lutador. Por si só, tal não é algo grave, pois estamos a falar do Ace da empresa, o pior foi o que se seguiu. O Sugiura juntou-se aos Suzuki-gun e venceu belt. Sim, a esta altura, o belt foi dado a uma figura das segundas linhas da NOAH, que passou, inclusive, a ter o ónus de estar agora a precisar dos Suzuki-gun para ter sucesso. Seguiram-se trocas sucessivas do título com o Go Shiozaki (sim, mas uma figura já conhecida), até que finalmente perdeu o título para o Nakajima, que vinha com algum ímpeto por ter participado no G1, mas que na NOAH não tinha tido ainda nenhuma reação que lhe valesse tal vitória.

Quando toda esta história acabou, os Suzuki-gun deixaram a NOAH e voltaram para a NJPW, sem ter realmente posto over um lutador que fosse, e ainda levaram o Yoshinobu Kanemaru que era a principal cara da divisão dos juniores, deixando um roster totalmente perdido, sem rumo e sem a história que os segurou durante 2 anos, vendo-se obrigada recomeçar do 0, desta vez com um roster sem estrelas que permitisse criar outras estrelas, vendo-se entregue a si própria, à sua sorte e com poucas perspetivas de futuro.

Poder-se-ão estar a perguntar o porquê de eu ter feito este pequeno apanhado histórico e um apanhado relativo a este aspeto em específico. Bem, é muito simples, porque a oportunidade que a NOAH não aproveitou em 2015/2016, é muito semelhante à oportunidade que a NOAH tem no contexto atual. É verdadeiramente uma oportunidade de ouro que pode, deve e tem de ser aproveitada.

O investimento feito na NOAH durante este ano levou a que se conseguissem regularmente estrelas como Kazushi Sakuraba, Keiji Mutoh, Fujita, entre muitos outros lutadores com mais de 45 anos, muitos deles com mais de 50 até, que são verdadeiras lendas do Japão, lutadores que os fãs idolatram e sobre os quais querem ver o máximo possível até à sua retirada. São estes lutadores que têm constituído o grosso da NOAH este ano, principalmente nos main-tags dos cards em quase todos os shows, bem como muitos até têm lutado por títulos. Note-se que o próximo candidato ao título do Go Shiozaki é precisamente o Keiji Mutoh, que já tem 57 anos.

Brain Buster #91 – Sustentabilidade

Mas não só os lutadores que a NOAH foi buscar já têm uma idade avançada, também as suas estrelas estão nessa situação. Naomichi Marufuji, Takagi Sugiura, o Taniguchi, o Akitoshi Saito, o Yone, entre muitos outros também se encontram na fase final da sua carreira. Os que não acompanharam NOAH podem não acreditar, mas se tirássemos todos os lutadores com mais de 35 anos deste roster, não teríamos nem metade do roster. Ora, uma situação destas tem vantagens, que até agora estão a ser perfeitamente executadas pela NOAH, mas também tem inconvenientes, com os quais é preciso tomar cautelas e ter já um plano de fundo para elas não acontecerem, sob pena de se cair num erro histórico com o qual se deveria ter aprendido.

É verdade que o plano inicial para estes lutadores é elevaram os cards e a fed, e isso foi cumprido na perfeição este ano. A NOAH conseguiu arenas bastante cheias e arenas com capacidades bem substanciais, tinha quase sempre cards que invejavam qualquer promotora, e colocaram sempre estes veteranos e lendas em combates importantes, que iriam sempre dizer muito aos fãs. Tivemos o Mutoh a reconhecer o Kaito numa história que com certeza ainda não acabou, o Fujita a colocar o Shiozaki over, o Sakuraba a elevar o Kenoh e, mais do que isso, a fazer uma das tag teams mais interessantes do ano com o Sugiura que atribui interesse a uma divisão que há anos que não contava para nada. Isto foi um bom booking e um booking inteligente.

Mas esta foi apenas a primeira etapa deste plano, ou pelo menos tem ou devia de ser. A NOAH não pode ficar por aqui, não se pode ancorar em algo que resulta apenas a curto prazo, tem de ser mais ambiciosa. Daqui a um ano não podemos continuar a ter nos main-tags 8 lendas ou veteranos, temos de ter malta como o Kitamiya, como o Soya (que foi das melhores aquisições da NOAH este ano e que merece, a meu ver, mais destaque a solo), lutadores que, não sendo rookies, são o grosso do card e que se assemelham à ascensão do Sugiura na NOAH. É verdade que o main-event tem de estar ocupado por 4 ou 5 nomes fortes, mas as segundas linhas são importantíssimas para constituir vários combates interessantes ao longo do ano ou nos torneios, ou mesmo para fazer defesas dos títulos onde, embora o resultado pareça certo, proporcione interesse aos fãs.

O produto da NOAH atualmente é tremendamente melhor do que foi em 2017, 2018 ou mesmo em 2019, mas não é o melhor no Japão (apesar de provavelmente ter tido grande parte dos combates nos Top 10 do ano), mas muito menos é o produto mais sustentável. Com isto temos de contar que o Marufuji já ultrapassou, muito provavelmente os melhores anos da sua carreira, embora eu acredite que ele ainda possa surpreender, e que o Go Shiozaki que se tornou este ano na estrela que a NOAH sempre quis que ele fosse também está quase nos 40. O tempo não para, passa demasiado rápido, e o índice de capacidade de renovação das novas estrelas da NOAH tem de ser mais rápido e muito mais eficaz. O exemplo mais paradigmático nesse aspeto é a NJPW, e não será por acaso que ela é a Nº1 do Japão nesse momento. Para mim há decididamente três nomes que têm de ser pushados até à lua este ano: Kenoh, Katsuhiko Nakajima e Kaito Kiyomiya.

Brain Buster #91 – Sustentabilidade

O primeiro destes nomes chegou a ter boas reações em 2017 e foi a primeira surpresa após saída dos Suzuki-gun no que diz respeito a ter reação do público, mas o seu reinado foi interrompido abruptamente e nunca mais conseguiu se voltar a esse nível, até exatamente este ano em que venceu o GHC National title e tem tido uma capacidade de criar interesse nos vários adversários que enfrente como ninguém tem na NOAH há anos. O Nakajima falhou a conquista do título, mas para o ano tem de continuar a ter um booking forte, a NOAH tem que arranjar maneira de esta sua derrota não ser o fim de algo, mas apenas o início. Caso contrário, a separação do Shiozaki e o lançamento no N1-Victory morreu prematuramente, e o Nakajima ficará sempre na sensação dos fãs como o “e se…”.

Por fim, o Kaito, apesar de ter perdido o GHC Heavyweight title, acabou por ter um ano com várias rivalidades interessantes, nomeadamente com o grupo do Marufuji, com o Keiji Mutoh e com o Kenoh. Há nele aspetos indiciários que o tornam numa estrela imediata aos olhos dos fãs, mais até do que quando o Nakajima estava na sua posição. É verdade que perdeu para o Mutoh, mas a história de que cometeu erros de principiante contra um dos melhores de sempre, mas que foi reconhecido pelo Mutoh, embora com algum desprezo, fazem com que esta história se torne das mais interessantes para 2021, pois as interações e respetivo combate (na medida do possível por causa das limitações físicas do Mutoh) deverão ficar na nossa memória durante muito tempo. O Kaito é aquilo que a NOAH não tem desde o KENTA e o Marufuji, e é bom que a NOAH consiga aproveitar.

Posto isto, esta histórica promotora, embora com poucos anos de atividade, sempre teve uma enorme dificuldade em criar estrelas, seja porque motivo for. Acabou várias vezes por desperdiçar oportunidades ou teve lutadores que não beneficiaram do momento ou mesmo do booking e, consequentemente do sabor dos fãs. Gostaria que em 2021 esta rota se alterasse, gostaria de ver mais pessoal jovem nos undercards, gostaria de não ver tantas lendas e veteranos no show, até porque tal, a certa altura, tem um efeito perverso. É verdade que os fãs ao verem os veteranos sentem que estão a sentir algo especial, mas vocês sabem exatamente o que acontece quando se repetem momentos especiais, uma e outra vez atrás outra…isso mesmo! Eles deixam de ser especiais, e o prazo que a NOAH tinha para aproveitar a sua popularidade, credibilidade e legitimidade prescreve, pois as feuds e vitórias dos seus lutadores de futuro sobre eles não têm tanto impacto.

2021 será um ano interessante para ver como a NOAH conseguirá apreender isto que estou hoje aqui a dizer, ou se deixa cair mais oportunidade tendo benefícios a curto-prazo, mas que sejam completamente descompensados pelos prejuízos de futuro. 2021 tem de ser o ano em que o plano muda, tem de ser o ano de proatividade e não reacionarismo. É, verdadeiramente, o ano de tudo ou nada. Se me perguntassem, diria que se têm que jogar as fichas todas.

Hoje ficamos por aqui.

Até para a semana e obrigado pela leitura.

8 Comentários

  1. Não conheço o produto mas através deste artigo fiquei com vontade de acompanhar.
    Ótimo trabalho

  2. Sandrojr4 anos

    2021 será o ano que veremos se a Noah está vingando ou não, acho que o Nakajima que se destacará neste ano, mas o kaito também virá forte. Ótimo artigo.

  3. Willian Dos Santos4 anos

    otimo Artigo !
    Concordo com a Parte em que você se preocupa com o Futuro da empresa especialmente com a forma que os jovens vem sendo tratados.
    Não entendo o pq de Nomes como: Harada,Kotoge,Tadasuke e Kotaro ainda estarem na divisão jr. ,quando poderiam estar na divisão Heavyweight sendo utilizados de uma forma mais benefica para a Empresa.
    Acho que a Noah deveria também deixar um pouco o Orgulho de lado, e tentar trazer lutadores de fora da empresa, sejam eles japoneses ou não.
    Gostaria muito de ver nomes como:
    Yuji Hino,Takuya Nomura,Fuminore Abe,El Lindaman e T-Hawk.
    Todos esses nomes citados,são lutadores jovens,versáteis e com muita rodagem.
    Nomes que poderiam vir a agregar muito no roster.
    Concordo com você a respeito das divisões Heavyweight e tag team,que para mim foram os pontos aonde precisavam ser melhor trabalhados e nesse ultimo ano,foram devidamente trabalhados pela Noah.
    Quanto a Divisão Jr. pra mim é a melhor divisão do Japão. Ela é dinâmica e muito bem estruturada,além de ter sempre combates de altissimo nível.
    A única coisa que NÃO concordo com Você, e a respeito da utilização das lendas que para mim,a Noah mostrou como se utiliza de forma correta os veteranos. Não apenas para trazer momentos saudosos,mas para mostrar que apesar de velhos,eles ainda tem seu espaço e podem ser uteis não apenas para trazer mais fãs para a Noah,mas também elevar os jovens e ajuda-los a evoluir !!!
    Uso de exemplo o Kaito que em 2019 ao meu ver,ainda mostrava estar um pouco verde,mas após a feud que o mesmo teve com o Mutoh, evoluiu de uma forma assombrosa.
    Pra fechar, eu como fã da Noah,estou mais que satisfeito com o trabalho feito nos ultimos 2 anos.
    Apesar de ser suspeito pra falar,mas acho que em 2020,a Noah foi a Melhor empresa japonesa.
    Estou muito esperançoso para ver o que futuro reserva para a Noah !!!!
    Mais uma vez parabéns pelo excelente trabalho e muito obrigado.
    Obs: Desculpas pelo Textão kkkk.

    • Obrigado pelo comentário interativo e interessante. Divisão dos Jr. é a melhor do Japão, sem dúvida, mas acho que há apenas um Jr. que pode subir à divisão Heavyweight, que é o Harada, e é exatamente pela mesma razão do KENTA e do Ogawa. É que ele é demasiado talentoso para estar limitado àquela divisão. Os restantes só com muita dificuldade algum dia chegarão lá.
      Esses nomes são muito fortes! Mas acho que nenhum estaria disposto a um contrato com a NOAH, mas seria sempre bom se conseguissem esses nomes por uns shows. Pelo menos devem levar menos dinheiro do que as lendas.

  4. Doc Brow4 anos

    Excelente.