Opinião Feminina #324 – Four years in the making

Há quatro anos, The Shield continuava a sua revolta contra a autoridade estabelecida por Stephanie McMahon e Triple H, Brock Lesnar preparava-se para enfrentar Undertaker no que todos pensávamos – na altura – ser um combate relativamente previsível e Daniel Bryan, juntamente com a sua legião de fãs, caminhava a passos largos em direção ao combate principal da WrestleMania. Há quatro anos, tudo começou, em Nova Orleães, com o combate que todos julgávamos ser previsível, mas não foi. Brock Lesnar venceu Undertaker na WrestleMania XXX acabando com uma série de vitórias que todos pensávamos ser absolutamente intocável. Roman Reigns, juntamente com os seus companheiros de equipa, venceu os New Age Outlaws e Kane num combate rápido e decisivo. Foi assim que começou um ano de preparação para o combate principal da WrestleMania 31, onde Roman Reigns estava agendado para vencer e destronar Brock Lesnar.

Quatro anos depois, novamente a caminho de Nova Orleães, o cenário repete-se com algumas pequenas alterações. Shinsuke Nakamura venceu o Royal Rumble em Filadélfia, dando à apaixonada plateia um vencedor que nunca seriam capazes de recusar e Roman Reigns conquistou o seu lugar no combate principal da WrestleMania ao vencer o combate de Elimination Chamber, mostrando que a WWE corrige os poucos erros que reconhece como tal.

Desta vez, também a mala de Money in the Bank também já não é um factor. Quando, em 2015, se viu que os fãs iriam novamente apoiar Daniel Bryan em detrimento do escolhido na altura para estar no combate principal da WrestleMania, a WWE recuou no último instante e preferiu transformar o combate de Reigns e Lesnar numa Triple Threat  através do cash-in de Seth Rollins. Foi uma solução engenhosa, resultou na perfeitação e criou um momento de WrestleMania protegendo todos os envolvidos.

Portanto tudo indica este combate entre Brock Lesnar vs Roman Reigns não sofrerá alterações, é definitivo e não teremos que assistir a mais repetições no futuro. É desta! Porque este tem sido o foco principal da companhia nos últimos anos. Sabemos que tem sido o plano da companhia desde de 2014, pelo menos, mas quem sabe? Se calhar já tinham ponderado a possibilidade em 2012, o ano em que Brock Lesnar voltou e Roman Reigns se estreou no plantel principal. Roman Reigns vs Brock Lesnar no combate principal da WrestleMania é o cenário idílico que a WWE quer concretizar e quer que corra bem, sem quaisquer falhas.

Todavia… O que é que “é desta”?

É desta que corre como a WWE sempre idealizou e não teremos que assistir a mais alguns anos de preparação para este combate? Será que dentro de quatro anos, não assistiremos a tudo isto novamente? É desta que Roman Reigns se imortaliza como a estrela principal da companhia? É desta que os fãs finalmente cedem na sua embirração e o apoiam como a WWE prefere que ele seja apoiado?

Sinceramente, não sei o que será “desta”. Certamente, a WWE está a prevenir-se e evitou alguns problemas – particularmente em não ter dado a vitória no Royal Rumble a Roman Reigns – mas não sei se este é um cenário que eles alguma vez iriam conseguir repetir da forma perfeita que idealizaram.

Daniel Bryan está permanentemente fora da equação, mas e Braun Strowman? É certo que os dois não se comparam em popularidade ou talento, mas Strowman destacou-se bastante em 2017 e a sua popularidade subiu durante e, em parte, graças à sua rivalidade com Roman Reigns. E, apesar de manter a sua preferência para com Roman Reigns, a WWE esforçou-se bastante para proteger e manter Braun Strowman no topo. Aliás, tal viu-se no Elimination Chamber do passado domingo, onde Strowman eliminou quase todos os participantes, dominou durante grande parte do combate e, no fim, passou por cima de Reigns como se fosse um rolo compressor. Não sei se os fãs irão virar-se contra Reigns para favorecer Strowman e sabotar o combate por ele, como aconteceu com Bryan, mas tendo em conta a sua crescente popularidade e a forma como a WWE o tem protegido, é uma possibilidade. É um risco. E quem os pode culpar, se assim o decidirem? Depois da forma decisiva e assertiva como Strowman tem sido protegido e apoiado?

Afinal, porque é que o monstro imparável que sozinho dominou e venceu cinco das estrelas principais do programa não está incluído no combate principal da WrestleMania? Em teoria, não faz sentido. Porque não experimentar algo diferente – se bem que um tipo ainda maior, mais imparável e mais musculado ser a escolha da WWE para adversário de Brock Lesnar na WrestleMania não é propriamente diferente, no que toca às preferências da WWE – em vez de voltar a investir na realização de um cenário fantasioso que muito dificilmente irá correr exatamente como a companhia sempre sonhou?

Voltamos ao início… O que é que é “desta”?

O que é que isto vai mudar para Roman Reigns? Roman Reigns já foi campeão principal três vezes, já foi campeão de equipas, já ganhou o título de Estados Unidos e o título Intercontinental. Em seis anos como lutador do plantel principal, ele foi uma das estrelas principais durante quatro desses anos. Das cinco WrestleManias em que participou, esteve no combate principal de três e vai agora para o seu quarto combate principal consecutivo, na sua sexta WrestleMania.

Isto parece o currículo de alguém que precisa de uma coroação, com toda a pompa e circunstância? Isto parece o currículo de alguém que ainda não é a estrela principal da companhia? E atenção, nem sequer estou incomodada ou a reclamar com a quantidade de feitos que Roman Reigns já somou. Reigns foi a estrela que a WWE escolheu, é apenas natural que a WWE aposte nele em força e lhe dê literalmente tudo. O meu problema nunca se resumiu à quantidade de feitos, mas sim à forma como as histórias são contadas. Não tiro prazer nenhum em ver a estrela principal, a estrela que é suposto todos adorarmos, ser vaiada e não me dá gozo nenhum assistir a histórias onde Reigns é obrigado a portar-se como um herói adorado, quando a realidade não o reflete.

Se o que a WWE espera desta fantasia que alimenta há anos é ver Reigns a ser lançado como a estrela do futuro, com um enorme momento emotivo que irá perdurar durante a décadas, acho que vão apanhar uma grande desilusão. É impossível criar esse tipo de carga emocional em torno de alguém que já fez e conseguiu tanto! É como em 2016, quando tentaram vender a fantasia e a emoção de Reigns a tornar-se campeão na WrestleMania ao derrotar Triple H, quando este já tinha sido campeão duas vezes poucos meses antes. Reigns foi um campeão de transição para facilitar a sua própria vitória pelo título na WrestleMania. Vou repetir – Roman Reigns venceu o título duas vezes, apenas para o perder duas vezes, porque só na WrestleMania é que conta a sério. É confuso, surrealista, hilariante, mas absolutamente verdade. E não o ajudou.

Reigns já é a estrela do futuro. Reigns já é a estrela desta geração, desde que há quatro anos a WWE decidiu que assim iria ser. Infelizmente, estes quatro anos não correram da melhor forma criativamente e a WWE nunca soube como recuperar e proteger Roman Reigns, por isso limita-se a repetir o mesmo cenário na esperança de conseguir aquilo que quer por pura teimosia.

Roman Reigns é uma estrela com uma carreira cheia de momentos, particularmente nos grandes eventos, mas no resto do ano, ele perde-se com frequência e a WWE abranda na intensidade com que investe nele. Como este é o seu quarto combate principal consecutivo na WrestleMania, Reigns tem sido frequentemente comparado a John Cena e ao início de carreira de Cena como estrela principal, mas John Cena era invencível e indestrutível todos os dias do ano.

Reigns surge em força durante a época de WrestleMania, mas fora isso raramente é retratado como Cena era em 2005/2006/2007. Ao longo destes quatro anos, Reigns perdeu a sua importância e relevância em rivalidades ridículas e mal construídas com estrelas como Big Show e Bray Wyatt, foi ofuscado pelo talento, carisma e popularidade de Dean Ambrose e Seth Rollins, passou uma boa parte de 2017 a valorizar e ajudar Strowman a cimentar-se como um monstro. Atenção, não estou a dizer que todas estas decisões foram más e que Reigns devia ter sido absolutamente imparável desde o primeiro dia, apenas estou a realçar que, apesar de Reigns ser, sem qualquer sombra de dúvida, A estrela – a forma como é retratado e tem sido retratado ao longo dos últimos anos em nada se compara aos primeiros anos de John Cena no topo. Mas, quem sabe? Se calhar essa parte da carreira de Reigns vem a seguir, pois é desta!

Isto só vem frisar que, apesar de protagonizar um dos combates mais planeados e decididos com mais antecedência da última década, Roman Reigns não tem uma carreira de histórias, mas sim de momentos. E essa é uma das razões pela qual não recebe apoio de forma unânime.  Uma personagem que passa e vive histórias, acaba por sofrer mudanças. É a única forma de a forçar evoluir. Roman Reigns e Brock Lesnar estão exatamente na mesma posição e eram exatamente as mesmas personagens há quatro anos atrás. Isto só vem reforçar a sensação de repetição forçada que temos sentido.

Esse é o principal problema deste combate, porque todos sabemos que provavelmente vai ser brutal. Quando permitido, Brock Lesnar mostra vulnerabilidade, está disposto a sofrer e isso torna os combates em que participa brilhantes. Já Reigns provou, vezes e vezes sem conta, que consegue ter um combate espetacular. A qualidade deste combate nunca esteve em questão.

Quem sabe se, há quatro anos, a WWE não tivesse cedido e tornado Reigns no maior vilão da companhia, por esta altura, ele já tivesse conquistado os fãs e se tivesse tornado, unanimemente, no maior herói da companhia? Hoje, estaríamos com uma expetativa completamente diferente relativamente a este combate, porque não seria a mesma coisa. Não seriam as mesmas personagens.

Reigns continua a ser um tipo com mania que é bom (infelizmente, com razão) que é retratado como herói e vilão consoante o dia da semana e com um histórico de histórias mal contadas que levam a que seja estupidamente fácil implicar com ele.

É exatamente esse problema que a WWE atacou na passada segunda-feira. A WWE já percebeu (também, se não percebesse em quatro anos!) que Reigns não é uma pessoa fácil com quem simpatizar, portanto decidiu que em vez de tentar convencer os fãs a gostar de Reigns, mais vale convencê-los a odiar o seu adversário, Brock Lesnar. A ideia é boa e a execução, por parte de Reigns através de uma promo no passado Raw, ainda foi melhor.

Estamos à porta da WrestleMania, onde Brock Lesnar está agendado para lutar no combate principal, portanto ele sabe que está na altura de negociar o seu contrato e os seus milhões e se para isso tiver de fazer olhinhos à UFC, então nada mais fácil! É mais um dos aspetos que nos leva a crer que já passamos por isto por uma vez.

A WWE sabe como Brock Lesnar funciona, então está a usar a realidade, uma realidade conhecida, para beneficiar Roman Reigns. Afinal, é completamente viável e vai de acordo com a personalidade de Lesnar que este decida usar a UFC para regatear mais dinheiro e até decida faltar às suas datas. Não é nada que ele não tenha feito antes ou tenha mostrado ser capaz de fazer. Foi tão bem feito e executado por Reigns e é algo tão possível de ser realidade que muitos acharam mesmo que era. E se calhar é, o que é que eu sei disto?

Pela primeira vez, Reigns falou como um ser dotado de sensibilidade e posicionou-se do lado dos fãs. Ele pode não ser fácil de gostar, mas desta vez está a lutar por eles, pelos seus colegas e pelo seu amor à indústria contra o capitalista, frio, calculista e conhecido regateador, Brock Lesnar. Isto pode funcionar. Ainda faltam quatro edições do Raw até à WrestleMania, portanto a WWE ainda tem muito tempo para estragar isto, mas pode funcionar. Pode não resultar em apoio em massa a favor de Reigns, mas pode resultar em apoio a Reigns por defeito (porque não querem apoiar Lesnar). Acho que só podemos é esperar que resulte melhor para Reigns do que resultou para Cena, quando este enfrentou The Rock. Porém, acho que para a WWE, nesta altura do campeonato, tudo o que vem à rede é peixe. Mas, pode funcionar. Especialmente, porque depois de quatro anos a ver Brock Lesnar ser o monstro imparável, de combates repetitivos e previsíveis aborrece.

Não deixa de ser irónico que esta fórmula de Lesnar começou a entediar no exacto momento em que se tornou super popular – WrestleMania 31, o evento onde “Suplex City” nasceu.  A fórmula cansa quando é posta em prática durante anos a fio, com poucas ou nenhumas pausas. Strowman devia ter vencido Lesnar no No Mercy, ou não o devia ter enfrentado de todo – um dos exemplos das consequências desta fórmula.

Não vai ser fácil para a WWE concretizar a sua fantasia sem problemas e com sucesso. Esta estratégia é a melhor ideia que podiam por em prática tão perto do combate (claro que em quatro anos, tiveram tempo de fazer muito mais e melhor). Aliás, já começaram a irritar os fãs que pagam para ver os eventos ao vivo ao lhes darem ontem um combate de apenas de trinta segundos de Brock Lesnar. Mesmo assim, a plateia que vai estar presente na WrestleMania não é fácil e com quatro semanas pelo meio, ainda muita coisa pode correr mal. Esperemos que a estratégia resulte e com Paul Heyman a fazer promos de vilão em nome de Brock Lesnar, tal só pode correr bem.

Agora esperemos que, entretanto, Reigns não seja apanhado num escândalo envolvendo o uso de esteróides, estrague toda esta fantasia e daqui a uns anos tenhamos de passar por isto tudo outra vez. Portanto, não. Não é desta que Reigns se lança como a grande estrela desta geração. Ele já o é. Talvez não seja desta que animosidade dos fãs para com ele acabe, sinceramente não sei e já sou indiferente ao dilema. Mas pode ser, pode ser que seja desta que a WWE encerra este capítulo e arranja outra fantasia com que se obcecar. Obrigada e até daqui a duas semanas!